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#31| MAIO 2009
PAULO DINIS
Director Financeiro da SAPA II Perfis
"Se as margens estão mais pressionadas, tudo o resto tem de estar mais pressionado"

Prevê-se que já no segundo trimestre do ano, só no Reino Unido, possam estar em risco cerca de 15 mil postos de trabalho no sector financeiro. Sendo que a realidade actual obriga globalmente a trabalhar com equipas cada vez mais pequenas, quais os principais critérios que um (Director Financeiro) DF impõe na contratação das pessoas com quem trabalha mais próximo?
Infelizmente, é uma exigência natural trabalhar com equipas mais pequenas. O meu historial na empresa mostra um pouco esse cenário: apesar de trabalhar na mesma empresa há mais de dez anos, já mudei várias vezes de função. Além disso a própria organização sofreu várias mutações: começou por ser gerida familiarmente, foi comprada por uma sociedade de capital de risco e, por fim, vendida a uma multinacional. Há oito anos convivi com uma direcção financeira composta por 50 pessoas que hoje possui apenas 11 (com algumas contratações de pessoas-chave). Nas contratações procurei sempre pessoas com experiência, mas julgo que é o nível de autonomia que faz a diferença. Essas pessoas devem sentir-se suficientemente motivadas, obviamente com linhas de orientação, mas livres para tomar decisões. Só intervenho para ir afinando alguns pormenores. E, por fim, obviamente a capacidade de trabalhar em equipa. Soam a clichés mas são critérios necessários a funções integradas em estruturas cada vez mais reduzidas. Isto não implica que se trabalhe menos mas sim de forma mais eficiente. A estas pessoas é pedido que entendam o processo de trabalho e que tenham vontade de o mudar, para que não se repitam erros e vícios do passado.
No mercado, para esta função, felizmente, a experiência é abundante, por via da redução de quadros. Não podemos é oferecer às pessoas novos projectos, porque essa realidade não existe actualmente nas empresas, apenas podemos pedir que tenham espírito crítico dos processos. A questão a colocar é “que valor acrescentado é que o colaborador transporta para a empresa que o cliente esteja disposto a pagar?” Vejo este cenário como normal quando, genericamente, estamos a falar, em termos industriais, em reduções a rondar um terço do volume de negócios. Não há menos trabalho mas existe, de facto, uma pressão para adequar a estrutura.

Como?
Trabalhando mais, e nisso os portugueses são dos que o fazem por mais horas e só não são mais eficientes porque, por exemplo, para fazer uma cobrança ou um pagamento há muito mais entraves que no estrangeiro. Há uma série de constrangimentos que faz com que as boas práticas de fora sejam difíceis de implementar. Mas o futuro passa por sistemas mais eficientes, reduzindo o trabalho administrativo, com um software que o consolide. Não pode ser o DF a escolher o sistema ideal porque são os utilizadores que o ajudam a implementar e ir optimizando a estrutura. Sinceramente não me recordo de despedir ninguém por falta de performance, mas sim adequamo-nos a um negócio com margens mais baixas e, se as margens estão mais pressionadas, tudo o resto tem de estar mais pressionado.

Actualmente, talvez o maior dilema do DF seja lidar com o excesso de informação em contraste com a reduzida confiança dos empresários. Qual deverá ser então a orientação do DF, nas relações dentro e fora da organização, perante este cenário económico altamente retraído?
Os stakeholders também se adaptam. Hoje em dia não querem lucros, em termos genéricos. Como quase todos os negócios têm prejuízo, querem é que não lhes peçam mais dinheiro! Esta crise consistiu num processo de aprendizagem a todos os níveis, pois um prejuízo controlado, dentro do objectivo, passou a ser o admissível. Aí os stakeholders, accionistas e os próprios media têm influenciado decisivamente. Hoje os sistemas informáticos permitem-nos discernir o que é importante, descascando a estrutura de custos ao cêntimo mas ao fim do dia a actividade da empresa resume-se a números e as resultados, independentemente se temos a melhor estratégia do mundo. O DF - que continuo a achar que tem um papel muito relevante - tem aí a responsabilidade dar um empowerment aos colegas, responsáveis pelos processos de fabrico e ao director comercial para poderem trabalhar autonomamente e directamente. Hoje não há espaço para intervenção do DF nessas áreas. Deve sim concentrar-se em aumentar o EBIT, EACC ou o Return on Capital Employed. No passado as coisas funcionavam mais na lógica das margens de venda e não em prazos de recebimentos, e o impacto que isso tem na empresa.

Um dos grandes desafios actuais do DF é o de tornar eficientes os custos da sustentabilidade. Na sua opinião, de que forma é isto possível? Sente que a separação da SAPA Portugal e de ambos os negócios (Industrial e sistemas de construção), pode ter sido um passo decisivo e necessário nesse sentido?
Eram negócios que estavam a ser geridos na mesma empresa mas que têm ritmos diferentes. De tal forma que a empresa de produção tem sofrido menos com a crise (o que não quer dizer que não venham a sofrer). Enquanto nós vendemos processos de fabrico, a outra empresa vende o produto. Mesmo quando éramos 26 pessoas na direcção financeira, antes da separação, já havia claramente diferentes equipas de negócio. Apenas eu e o responsável pela relação com os bancos trabalhávamos para os dois negócios.
Ao nível da sustentabilidade, qualquer responsável por uma empresa tem de ter a obrigatoriedade de não reduzir custos só por reduzir mas medir bem o custo do investimento que enceta hoje. Não acredito que haja empresas cujo objectivo seja não ter pessoas. No nosso país estamos a atravessar uma fase em que estamos mais alinhados com as novas tendências, apoiadas nas tecnologias de informação, e a tendência é para o nível subir. Contudo, na prática, não basta o administrador dizer que é importante implementar um sistema, é necessário ter as melhores pessoas dedicadas de alma e coração ao projecto e eu tenho de lhes dar condições para isso. Precisamos de recursos humanos capazes de manusear com autonomia estas novas tecnologias de forma a estar mais próximas da direcção comercial, da direcção de produção (e respectivos area managers), cada vez a níveis mais baixos da cadeia de produção. Porque é muito fácil perder a noção do objectivo final, no cúmulo, o operador tem de perceber com que é que está a contribuir para a empresa. E esta é uma oportunidade ideal para se mudar o que sempre ambicionámos. Já não faz sentido pensar numa lógica de reduzir custos, porque as empresas não podem reduzir mais. As empresas têm é target costing, um preço fixo, definindo o que quer vender e, na direcção financeira, ajustar os custos. Qual é o negócio que se pode dar ao luxo de manipular o preço de venda? Apenas uns nichos.

No caso português a dificuldade ainda deve ser maior...
Parece que os portugueses precisaram da crise para começar a reagir. As empresas já deviam ter começado há bastante tempo a batalhar, como os bancos em Espanha, que definiram não ter objectivo de ganhar muito, obrigando-se de raiz a uma estrutura de cost to income muito baixa e isso é uma garantia que não há surpresas. E hoje esses bancos, já presentes no nosso país, conseguem ganhar mais que os grandes bancos graças a esta estratégia definida de longo prazo.

Para se ser empreendedor tem se ter uma baixa aversão ao risco. Pensa que a falta de optimismo e de capacidade de iniciativa tem sido decisiva para a falta de competitividade das organizações nacionais?
Até existe capacidade de iniciativa dos empresários. Eventualmente pode faltar algum profissionalismo na gestão. Os empresários portugueses que hoje estão bem foram aqueles que foram visionários há 40 anos atrás e que, a certa altura do seu crescimento, conseguiram deixar de ser aquela empresa centrada numa pessoa e tomarem um rumo mais profissional, trazendo alguém com know-how externo.
Não sei o que vai ser do nosso país daqui a uns anos, não vislumbro uma aposta concreta. Dou-lhe o exemplo da implementação da banda larga em Portugal - quando é um projecto com 10 anos de atraso – cujo destaque enorme dado pelo Governo eu não concordo. Acho que ter a banda larga nos dias de hoje é higiénico. Não o ter é que era mau. Enquanto há uma década atrás teria dado outros frutos.
Preocupa-me o facto de, se hoje já temos o presente como temos, se não assumirmos uma posição mais arriscada e agressiva, e se, ao mesmo tempo continuamos com lógicas de investimento mais controladas, o futuro não poder ser melhor. Por isso, sinto que, mesmo que falhássemos, deveríamos apostar em algo. Não vejo uma tomada estratégica e isso faz com que os empresários per si se contenham.
As empresas alemãs e francesas que entraram em Portugal há uns anos vão saindo porque encontram condições melhores noutros locais. Entretanto, a indústria portuguesa não se renovou: fechou porque não tinha condições para competir... Resultando num vazio enorme pois os lucros não ficam cá. Deveríamos apostar em algo nosso, por exemplo, o próprio Estado deveria assumir a aposta no vinho português que permanece desconhecido em muitos locais.

Actualmente, não haver meios para satisfazer dívidas pode ser a maior dor de cabeça para as organizações, uma vez que muitas delas estão sem dinheiro. Considera que o acesso ao crédito a pessoas e entidades de fracos rendimentos pode ter sido a causa do status quo actual?
Diria que não. Os bancos estão a reagir a posteriori. A necessidade de efectuar e receber pagamentos no nosso país tem fluxos muito desequilibrados. Enquanto na Alemanha, por exemplo, pagar é uma questão de honra, cá quem paga melhor que os outros sente-se mal. O que fez muita diferença foram os bancos e seguradoras de crédito que, depois de sofrerem, assumiram a posição de não emprestarem dinheiro. Isto é quase um crime nacional porque as empresas precisam de dinheiro para fazerem crescer as vendas e os bancos “fechando esta torneira”, não por questões de risco, mas para cumprirem com os rácios, etc., podem estar a ditar o fim de muitos negócios!

No contexto económico actual, a reacção mais imediata é a retracção e contenção de custos. Contudo, um estudo da Hays (publicado em Janeiro deste ano) revela que os empresários nacionais se consideram bem preparados para enfrentar a situação económica actual. Qual é a sua opinião?
Não concordo porque esta crise é tão diferente das outras, por ter quebrado com todas as políticas económicas do passado. A partir daqui deixámos de saber o que era verdade. Em termos gráficos os ciclos continuam lá mas a surgirem em espaços cada vez mais curtos. Contudo, nada nos garante que 2010 não será um ano precisamente ao contrário deste. Diria que a própria Economia tem hoje uma memória mais curta. É uma incerteza, mas continuo a achar que o pior já passou.
Qualquer organização está hoje mais flexível e as que sobreviverem a esta crise serão aquelas que, claramente, subsistirão, até porque já se aprenderam com muitos dos testes à sobrevivência do passado.

Está de acordo que a descida das taxas de juro poderá ser como uma medida curta e até uma forma de iludir as dificuldades estruturais do sistema económico mundial?
Estou de acordo. Mas é era a única forma. O próprio Banco Central Europeu revelou muita indecisão em avançar com esta medida que serve para satisfazer os mercados (porque estes investidores passam a descontar os investimentos futuros numa taxa inferior, etc.). Mas tem impactos nulos para quem gere um negócio.

Concorda que em 2010, provavelmente, todas as empresas vão ser mais pequenas?
Terão, inevitavelmente, estruturas mais pequenas. Irá haver uma selecção natural e bem-vinda entre as empresas menos preparadas. O ideal é que essas não fechem pela razão errada: para não pagarem ao fisco, fornecedores e trabalhadores, e para abrir entrando noutro ciclo. Entre as empresas mais aptas e especializadas espero é que não se perca negócio. Encaro como normal quem fecha como consequência de ter apostado num negócio errado (o que até é usual nos Estados Unidos – onde, mesmo pelos bancos, se dá valor à proactividade de quem tentou e se desvaloriza a condição de desempregado). O paradigma está a alterar-se e, pela primeira vez, estamos a assistir a pessoas do meu curso no desemprego, em rotação flexível. Já não há a ambição de trabalhar ao serviço de uma empresa para a vida inteira. Aliás, hoje os próprios directores-gerais têm a consciência que quem passa algum tempo na mesma função tende a desleixar-se. O problema do nosso país é que não há empresas a abrir, a criarem negócios e oportunidades.

Biografia
Paulo Dinis é Director Financeiro da empresa Sapa II Perfis desde Março de 2005. Assumiu este cargo após ter desempenhado desde Janeiro de 2003 o cargo de Director da Unidade de Negócios de Acessórios da empresa Sapa Portugal. Antes disso e durante mais de seis anos, havia sido Assessor da Administração e Business Controller da empresa Sapa Portugal, e Presidente do Conselho de Administração da empresa NTA – Novas Tecnologias em Alumínio. Paulo Dinis é licenciado em Gestão pelo ISCTE, tem uma pós-graduação em Corporate Finance pelo CEMAF, fez um curso de especialização em Contabilidade Financeira Avançada pelo OVERGEST e completou um MBA da AESE/IESE.
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