Um dos projectos em que a Critical está envolvida é a rede de mobilidade eléctrica recentemente apresentada. Quais as mais-valias financeiras que vislumbra para o país, num projecto deste tipo?
Parece-me um projecto de elevada relevância estratégica para Portugal, na medida em que contribui para a sustentabilidade ambiental e para o balanceamento da factura energética. Poderá por isso contribuir para diminuir a dependência de Portugal face aos combustíveis fósseis. Em termos mais genéricos, penso ser importante para um país com as nossas características apostar em projectos que ambicionem colocar-nos na vanguarda da evolução tecnológica internacional. Sabemos que é vital para a nossa economia encontrar um modelo de crescimento que tenha um enfoque muito claro no aumento massivo das exportações. Pela dimensão que temos, não seremos nunca um exportador de volume, mas podemos ambicionar exportar com um alto valor acrescentado. Isso só se consegue através de um importante investimento em inovação em clusters de elevado potencial.
E do ponto de vista da Critical, que vantagens financeiras e de reconhecimento poderão advir do envolvimento no projecto? Qual o vosso contributo?
A nossa participação será focada na infraestrutura de suporte e carregamento do projecto de um veículo eléctrico. Nesse âmbito, ficaremos responsáveis pela framework de gestão de tempo real da rede de estações de carregamento, aspecto de segurança, monitorização remota, entre outras áreas onde possuímos competências relevantes e track record da implementação deste tipo de sistemas em mercados como a Aeronáutica e Espaço.
Este é um projecto que sentimos ter relevância estratégica de negócio e que pode – no longo prazo – aumentar, decisivamente, a nossa oferta de soluções para o mercado dos transportes, onde, aliás, temos participado no desenvolvimento de soluções inovadoras, tais como sistemas para auto-guided vehicles.
Na qualidade de membro do conselho de administração da Coimbra Inovação Parque, como avalia a aposta na Inovação e Desenvolvimento existente na região de Coimbra?
Penso que o Coimbra Inovação Parque é um projecto muito importante para a Região Centro, na medida em que remata um modelo de desenvolvimento que poderá ser virtuoso. Temos, por um lado, uma Universidade que é bastante forte na investigação em alguns domínios da ciência e que através do seu Gabinete de Apoio à Transferência do Saber tem investido muito na aproximação do meio académico ao meio empresarial, inclusive fomentando o espírito empreendedor. Temos, por outro lado, incubadoras que têm feito um trabalho notável (destaco o Instituto Pedro Nunes e o Biocant) no acolhimento de empresas em fase de early stage. Faltava um Parque de Ciências que acolhesse as empresas numa fase mais madura do seu crescimento, e neste sentido o projecto é muito bem-vindo. Há alguns anos atrás a Critical sentiu imenso a falta na Região de um espaço com estas características.
Sente que é urgente promover uma sinergia entre a I&D e a gestão financeira?
Sem dúvida. Desde logo porque os projectos de I&D se estendem por ciclos de investimento que vão, no nosso caso, desde dois a quatro anos, os quais só poderão criar valor apenas no longo prazo. Isto obriga a um rigoroso challenging destes investimentos e a uma gestão financeira baseada em modelos claramente pluri-anuais e muito mais orientados para uma visão estratégica.
Os responsáveis financeiros estão a ser mais solicitados do que nunca para ajudar a explicar a crise financeira corrente e a ajudar as empresas a sobreviverem durante a mesma. Sente que o papel dos Directores Financeiros (DF) e dos Chief Financial Officers (CFO), dentro das organizações, na sua generalidade, pode sair reforçado no final deste período (que, apesar de tudo, poderá não ser assim tão transitório como inicialmente se suspeitava)?
Sim. Em fases de contracção da economia existe um empowerment adicional que é conferido aos CFO. Estes devem aproveitar para consolidar um conjunto de boas práticas na gestão dos recursos, tendo sempre em mente que, num contexto de maior rigor orçamental, deve existir um plano de comunicação eficaz que alinhe as diferentes expectativas dos principais stakeholders das organizações.
Atravessamos um período em que muitos lutam de forma dramática pela sobrevivência e, nalguns casos, as empresas optam por um DF com forte experiência operacional. Concorda que é importante ter uma pessoa que consiga gerir a reconstrução da empresa e reduzir custos ao mesmo tempo?
Eu entendo que é fundamental que o DF mantenha uma gestão virtuosa do binómio custo/investimento. Ou seja, se é fundamental impor estratégias mais ou menos agressivas de redução de custos, é também essencial garantir que, num contexto de retoma, a oferta da empresa está melhor posicionada do que antes face à concorrrência. No nosso caso, isto implica, sobretudo, a manutenção de investimentos em I&D e uma boa gestão do talento disponível.
Na mesma altura em que o INE revelou que as fortes quebras no investimento e exportações explicam a contracção da economia portuguesa, Belmiro de Azevedo criticou a falta de liderança a vários níveis no nosso país. Do seu ponto de vista, poderão estar aqui os grandes problemas?
De acordo, em relação à questão macroeconómica. Aliás, antes da crise Portugal já estava numa situação que não era propriamente interessante, pelo que terá dificuldades acrescidas.
Relativamente à questão da liderança, gostaria primeiro de contextualizar. O que me parece é que em Portugal temos, por vezes, um enviesamento primário em relação a este tema. No sentido em que confundimos chefia com liderança. O líder é, sobretudo, aquele que tem competências para construir e manter equipas fortes e coesas à sua volta. E encontramos de facto muitos teams of managers, mas poucos management teams.
Que leitura faz desta crise, considerando que teve por base o sector da banca e o seu principal refúgio (o sector imobiliário) áreas que os especialistas consideravam mais imunes à crise?
Penso que a leitura das causas é mais ou menos unânime entre os diversos especialistas. E é também ponto assente que urge construir uma ordem financeira mundial diferente da que tivémos no passado. O que me parece bem menos consensual é o tempo que irá decorrer até a economia mundial registar os níveis de crescimento normais.