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#35 | OUTUBRO 2009
PEDRO FALÉ
Director Financeiro do Grupo Madrilisboa
"Há muito Estado, mas com pouca qualidade"

Num período como o actual, a informação de gestão vale ouro. Quais as fontes de informação que o mantêm actualizado face às constantes alterações que atravessamos?
As fontes que utilizo são as tradicionais, ou seja, tento manter-me actualizado através da imprensa nacional e internacional (sobretudo a económica), de forma a acompanhar, quer a tendência dos mercados, quer as reacções dos diversos agentes económicos. Por outro lado, tento obter conhecimento através de uma formação constante, quer ao nível de cursos de pós graduação na área da gestão, quer através de acções de formação e congressos organizados pelas Ordens profissionais onde estou inscrito, uma vez que tais eventos permitem obter diversas visões sobre os vários assuntos em análise. Ao nível da organização utilizo as ferramentas que entendo mais adequadas e que se enquadrem no plano estratégico da empresa.

Sente que o papel do Director Financeiro saiu reforçado dentro das organizações com este período de crise, talvez no sentido de se ter tornado mais estratégico?
Numa organização bem estruturada, o papel do Director Financeiro (DF) ocupa necessariamente um lugar estratégico. Penso, no entanto, que o que esta crise trouxe, mais do que um reforço, foi uma maior visibilidade do papel do Director Financeiro. As consequências da crise actual. Traduziram-se numa falta de liquidez nos mercados. Ou seja, apesar das taxas de juro continuarem historicamente baixas, o acesso ao crédito faz-se de uma forma muito mais selectiva, sendo a maioria das empresas “convidadas” a “desalavancar”. Este factor leva a uma reequação dos seus investimentos e faz com que também as organizações sejam mais selectivas nas suas opções. Tal situação, de origem claramente financeira, vai ter consequências em todos os departamentos da organização, pelo que a visibilidade do DF passa a ser maior. No entanto, em certas organizações o papel do DF já era visto como estratégico, por via da participação na elaboração do projecto estratégico da empresa conducente aos respectivos planos de actividade e orçamentos. Não existe um reforço do papel do DF, apenas a constatação natural da função exercida, possivelmente, em organizações cuja estrutura não é a mais adequada, onde a estratégia e gestão de risco não são levados em consideração. É possível que com as crises passe a haver o reconhecimento da necessidade de um bom departamento financeiro e o papel que o seu director desempenha, podendo aí sim, sair reforçado.

O sector imobiliário tem sido ultimamente dos mais penalizados. Contudo, a Madrilisboa tem mostrado uma vitalidade assinalável. No seu entender, a que se deve este facto?
Efectivamente, o sector imobiliário foi muito afectado com esta crise, não só em Portugal como também, e de uma forma mais significativa, em Espanha. Por esta razão a Madrilisboa não é alheia à crise, tendo também ela sido afectada de uma forma significativa, sobretudo através dos seus parceiros espanhóis, estando agora mesmo a reestruturar-se, quer a nível accionista, quer ao nível de uma revisão do seu plano estratégico, de forma a tornar-se mais forte e eficiente. No entanto, e apesar da crise sem precedentes que se vive, sobretudo no sector imobiliário, a Madrilisboa elaborou um plano estratégico que previa a internacionalização, através do investimento em novos mercados (com especial enfoque no brasileiro). Bem como o investimento no nosso país na área da promoção imobiliária, em projectos cujos elevados padrões de qualidade sejam referências no mercado. Estes factores permitem à Madrilisboa olhar de forma confiante para o futuro. Prova disso é o recente protocolo celebrado com o banco Santander que, em plena crise de liquidez, garante financiamento a 100%, período de carência até dois anos e um spread bastante competitivo para os clientes da promoção “Parque do Rio”, no Parque das Nações.
Por outro lado, também no Brasil, a Madrilisboa em conjunto com os seus parceiros está envolvida num projecto que é já uma referência a nível mundial. A apenas 45 km do Rio de Janeiro está a ser desenvolvido o projecto “São Bento da Lagoa” que prevê 2.000.000 m² de construção numa área com 8 km de praia.
É esta atitude face ao investimento, que deve ser selectivo e pautado por elevados padrões de qualidade, que permitem à Madrilisboa, apesar da actual conjuntura desfavorável, encarar o futuro com grande optimismo.

Por muito científica que a economia possa ser, o comportamento humano é que vai determinar o que acontecerá. Cada vez mais há a noção que a liderança vai ser importante para manter a equipa motivada e focalizada em objectivos, assim como a escolha de candidatos com know-how em áreas de risco para integrar as equipas financeiras. Concorda?
Concordo, o comportamento humano é sem dúvida muito importante, razão pela qual a economia não descura esse facto, tendo inclusive existido nóbeis da economia que se centraram nesse tema, como foi o caso de Robert Lucas, com a teoria das expectativas racionais, ou John Nash, com a teoria dos jogos. Foram sem dúvida dois economistas que deram contributos muito importantes do ponto de vista da teoria comportamental associada aos mercados. Hoje em dia, e sobretudo na conjuntura actual, a área de risco é das mais importantes numa organização. Os recursos são escassos, pelo que é necessário identificar e analisar os riscos antes de se avançar com qualquer projecto, sob pena de colocar em causa a própria solvabilidade da empresa. No caso do sector imobiliário, onde a Madrilisboa actua e onde os investimentos são muito avultados, um mau planeamento pode traduzir-se na falência de uma empresa, dado os avultados investimentos. A margem para errar é pequena, pelo que a identificação dos riscos e análise dos diferentes custos de oportunidade devem ser levadas muito a sério.

Na sua opinião, qual deve ser a postura do DF no caso de uma empresa endividada? Que leitura faz do apoio do Estado às empresas em dívida?
Depende. O termo “empresa endividada” é por si só pejorativo, no entanto, é necessário analisar de que tipo de dívida se trata. Se for endividamento resultante de investimentos em capacidade produtiva que traga valor acrescentado à empresa, não vejo que a dívida seja um problema, uma vez que o serviço de dívida será suportado pelo valor acrescentado resultante do investimento. Se, por seu lado, se tratar de dívida em custos de estrutura cujo retorno dos capitais seja duvidoso, já estaremos perante uma situação preocupante e cabe ao DF tomar medidas conducentes à redução da mesma e agir de imediato sobre as suas causas, quer através da reestruturação da dívida existente, quer na eliminação das suas causas.
No que respeita aos apoios do Estado às empresas endividadas, penso que também aqui há que distinguir entre as empresas que têm viabilidade e as que não têm. Na minha opinião, o Estado não deve ajudar empresas ineficientes, sob pena de desvirtuar o mercado e originar concorrência desleal, prejudicando as empresas eficientes. No entanto, pontualmente, para as empresas que apresentam viabilidade, mas que devido a factores conjunturais estão “asfixiadas” do ponto de vista das suas tesourarias, penso que, sem que se desvirtue o mercado, estas podem e devem ser apoiadas pelo Estado: sobretudo, sendo o problema principal a falta de liquidez, através de linhas de crédito criadas para o efeito com vista à reestruturação da dívida já existente, bem como garantir a liquidez necessária até à retoma do mercado.

Um dos erros habitualmente atribuídos aos gestores é o facto de serem perigosamente dependentes da intervenção do Estado (como se este fosse o responsável pela recuperação financeira das empresas em crise). Concorda com esta leitura?
Infelizmente, está-se a criar essa ideia na opinião pública, fruto de guerras político-partidárias e de alguns casos onde efectivamente o Estado, por força do mercado onde as empresas actuavam, acabou por ir em seu auxílio. No entanto, para a generalidade das organizações o Estado não tem sido um factor de recuperação mas sim um factor negativo, derivado do seu peso excessivo na economia e crescente endividamento, tornando a carga fiscal em Portugal pouco atractiva ao investimento. De facto, penso que o Estado devia ter um papel importante nas empresas mas como regulador e criador de infraestruturas conducentes à competitividade das organizações, essas sim geradoras de emprego e de riqueza. Hoje em dia em Portugal, de um ponto de vista empresarial, a energia é muito cara, as leis laborais pouco atractivas e a carga fiscal muito elevada. Há muito Estado, mas com pouca qualidade.

Uma das principais lacunas que a direcção financeira de muitas organizações se depara é a adopção de um sistema de informação de gestão. Como encara este tipo de soluções, numa altura de pouco investimento, apesar das potenciais facilidades que poderá trazer a adopção desta solução – nomeadamente permitindo uma visão de 360 graus da empresa?
Penso que um bom sistema de informação de gestão é fundamental no auxílio às tomadas de decisão. No entanto, não devemos é confundir um bom sistema com um sistema “altamente” sofisticado e caríssimo, onde muitas das vezes a informação é tanta e tão dispersa que acaba por se tornar inútil e até mesmo prejudicial à tomada de decisões, para além de não se tirar partido da informação. O custo da mesma tende a ser elevado, derivado dos valores de manutenção que estes sistemas acarretam. É com tristeza que verifico, já desde os meus tempos de auditor, que a maioria das organizações não consegue tirar verdadeiro partido dos sistemas que implementaram, apesar dos investimentos avultados. São muito raras as organizações que conseguem tirar verdadeiro partido dos sistemas de informação de gestão, e essas sim, estão em verdadeira vantagem face à concorrência.

Mas acontece que, muitas vezes, as empresas têm essa informação na mão – que lhes custa muito dinheiro – mas não sabem como aplicá-la no negócio de modo a obterem uma visão única do mesmo e das suas operações. Concorda?
Tal como referi anteriormente, a maioria das organizações não tira proveito dos sistemas que implementou. A implementação de um sistema desta natureza exige um planeamento muito rigoroso que não passa por adquirir uma solução standard. A organização tem, em primeiro lugar, que definir muito bem qual a informação que necessita efectivamente e que pode ser obtida em tempo útil e só depois partir para a implementação do sistema. No entanto, o que se verifica na maioria dos casos é, um pouco à imagem do país, implementar tudo à pressa sem o mínimo de planeamento e em seguida “atamancar” e “desenrascar”.

Biografia
Pedro Falé é, desde Março de 2006, Director Financeiro do Grupo Madrilisboa. Entre 2001 e 2006 foi Auditor Financeiro em Amável Calhau, Ribeiro da Cunha e Associados – Sociedade de Revisores Oficiais de Contas. Licenciado em Economia pela Universidade Autónoma de Lisboa (UAL), em 1999. Pós-Graduação em “Gestão e Controlo dos Dinheiros Públicos” pelo Instituto Sócrates da UAL, em 2000. Master em “Auditoria Contabilística, Económica e Financeira” pelo Instituto Universitário de Desenvolvimento e Investigação da Administração da UAL em colaboração com a Universidade Autónoma de Madrid e Universidade da Estremadura, em 2003.

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