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#37 | DEZEMBRO 2009
NUNO COELHO
Director Financeiro da Vidis
"Vender sem receber é dar"

Hoje é comum a queixa das restrições de acesso ao crédito. Partilha da opinião que, para bons projectos, continua a existir financiamento e que esta baixa de concessão se aplica sobretudo aos particulares?
Penso que as empresas boas, em geral, continuam a ser apoiadas pela banca. Ao nível do nosso grupo, não temos sentido restrições de acesso ao crédito. Antes pelo contrário, somos muitas vezes abordados por bancos com as quais não trabalhamos. É natural que haja uma tendência maior para as empresas se profissionalizarem pois os bancos são cada vez menos decisores ao nível local. As decisões são tomadas centralmente, desconhecendo o meio onde as empresas se inserem e operam e com critérios exclusivamente económicos e financeiros. Por isso, é natural que, neste momento, as empresas menos estruturadas tenham mais dificuldades no acesso ao crédito.

Uma das maiores dores de cabeça de um responsável financeiro são os prazos de pagamento e recebimento. Sente que, nesta altura, há regulação que salvaguarde a liquidez das empresas?
Não, de todo. Internamente, ao longo dos últimos meses, temos feito um esforço enorme para condicionar o crédito que concedemos aos nossos clientes. Avançámos para uma operação em Coimbra, no ano passado, com uma envergadura maior do que a que tinhamos em Viseu, e onde as dificuldades de concessão de crédito são maiores ainda - num cenário mais "urbanizado", semelhante ao de Lisboa e Porto, onde as relações são menos personalizadas e institucionais. E aí o Estado tem alguma culpa - na forma como organiza as coisas -, pois não salvaguarda um apoio real às PME. Apesar dos incentivos ao crédito com juros bonificados serem importantes e interessantes, o factor mais importante que poderia ser introduzido, em termos de confiança na economia, seria o Estado dar o exemplo e injectar liquidez, cumprindo os prazos de pagamento normais com todos os sectores.

As empresas raramente usam alguns indicadores de performance como as dívidas de clientes e de fornecedores terceiros, bancárias e valor dos stocks. Não sente que com essa utilização poderiam credibilizar a gestão da organização?
É importante ter sempre indicadores de performance. Muitos dos pequenos e médios empresários que compõem o nosso tecido empresarial têm o negócio muito definido na sua cabeça mas não se apoiam devidamente nos números. É de facto importante termos alguns objectivos e sustentarmo-nos nalguns indicadores-chave como os que referiu. Estes poderão não permitir um controlo a 100% do negócio mas sabendo que a maioria deles estão dentro das metas definidas oferecem outro tipo de tranquilidade.

Em declarações a um orgão de comunicação generalista referiu que o Estado não tem sido feliz ao não estimular devidamente a circulação de dinheiro na economia junto das empresas. Partindo desta sua posição, como reaje perante as notícias que avançar que estão a ser injectados capitais públicos junto da banca (e não junto das organizações)?
É um dado curioso pois o próprio Banco Central Europeu injectou recentemente milhares de milhões de euros junto da banca que não chegam à economia real. Esse dinheiro foi aproveitado pelos bancos para se recapitalizarem, limparem alguns activos tóxicos que tinham no seu balanço, reforçarem capitais próprios, mas, se calhar, nem metade dessa ajuda chegou às empresas e aos particulares. Essa falta de liquidez tem contribuído para um atraso exponencial dos negócios, pois há muita gente a adiar decisões de investimento por falta de liquidez - não por falta de qualidade do projecto.
Os bancos são parceiros fundamentais e indissociáveis na dinamização de qualquer empresa e têm de gerir risco. Também acontece que os bancos conseguiram uma credibilidade maior do que muitas empresas - embora, como temos observado, organizações de maior solidez, possam estar melhor do que alguns bancos. Contudo, estes devem ser, neste momento, as únicas entidades que se conseguem auto-regular. Os malefícios da economia raramente chegam aos bancos. Entendo que o Estado deve apoiar e dinamizar a banca, mas nunca favorece-la, numa altura como a que atravessamos, e tratar todos os sectores de actividade pela mesma medida.

Segundo alguns especialistas, atravessamos um período de ligeira recuperação económica. Qual deverá ser a estratégia financeira e a postura de um Director Financeiro (DF) num cenário de retoma?
Apesar de alguns indicadores mostrarem esses sinais, penso que ainda é cedo para falarmos em retoma. Penso que as empresas não devem confundir o facto de descerem menos do que o esperado com crescimento. Julgo que deve haver muita prudência na concessão de crédito, factor fundamental no crescimento económico do país, e não menos ponderação em termos de investimento. Antigamente, com a facilidade de crédito, houve apostas sobrevalorizadas face ao benefício que o investimento propíciou. Agora, temos de ser muito mais sectivos e continuar a capitalizar as empresas - em termos de capitais próprios e permanentes. Há um cenário de recuperação económica, mas que, no meu entender, será mais lenta do que o que tem sido avançado. Deverá haver uma subida de taxas de juro, talvez só daqui a três anos, o que obrigará as empresas a criarem um aforro interno para que a sua capacidade de auto-financiamento possa ser suficiente para fazer face a alguns investimentos e não estar tão dependentes da banca (como anteriormente acontecia).
O DF sempre teve uma postura muito ponderada dentro de uma empresa, funcionando um pouco como o contra-vapor à direcção comercial e à expansão do negócio - pois, muitas vezes, é necessário refrear alguns ânimos com entusiasmo que se cria numa relação comercial. Nesta fase, em que preciso "apertar" ainda mais, o DF ganha alguma preponderância pois tem um papel de restringir, apostar mais nas condições, pressionar e pensar "mais à frente". Às vezes parece um contrasenso - se precisamos de vender para recuperar algum capital - mas obriga-nos a crescer de uma forma ponderada. O meu pai tem uma expressão muito interessante que descreve na perfeição este modo de ser: "vender sem receber é dar". Como não somos nenhuma instituição de caridade, não queremos dar dinheiro.

Um Estudo recentemente publicado pela PWC (Global Economic Crime Survey de 2009) adianta que "as pressões económicias levam a um crescimento acentuado das fraudes empresariais" - sendo que 30% das empresas mundiais reportaram fraudes nos últimos 12 meses. Como comenta esta conclusão, tendo em conta a realidade que conhece do mercado português e dos contantes escândalos financeiros que têm vindo a público?
É natural que a margem de manobra para as pessoas cometerem este tipo de crime seja mais alargada nesta altura. Quem está do lado das empresas tem uma estrutura fixa para sustentar e quer, a maioria das vezes, fazer negócio a qualquer custo - pois, se um determino segmento de negócio não cresce, tem de ir buscar a outro, se calhar com potencial de risco superior. Esse tipo de fraudes é muito mais susceptível nesta fase, onde os indivíduos, estão quase em desespero, ao invés de em circunstâncias normais onde me posso dar ao luxo de, por vezes, seleccionar o segmento.

Biografia
Nuno Coelho é gerente e sócio do Grupo Vidis, com sede em Viseu. Do grupo fazem parte as empresas Vidis (distribuidora exclusiva para o distrito de Viseu das marcas representadas pela Refrige, Unicer e Parmalat), Revidis (distribuidora da Sogrape, Cerveja Cintra e Águas do Fastio), Vidis C (distribuidora exclusiva para o distrito de Coimbra das marcas representadas pela Refrige e Unicer) e Lodivis (empresa licenciada para o transporte de mercadorias por conta de outrem). Exerce funções executivas nas áreas financeira, administrativa e informática. É sócio e TOC da empresa Marques Coelho & Jesus Consultores, Lda., franchisada da Fiducial. Exerceu funções no grupo Movicortes. Foi professor assistente estagiário da UAL, nas disciplinas de Gestão Financeira e Orçamental e Finanças (94/5). É Técnico Oficial de Contas. Licenciado em Gestão pela UAL. Pós-graduado em Gestão Financeira Internacional pela Faculdade de Economia do Porto (1996). Frequentou e completou o Curso Avançado de Comércio Internacional no IESF, no Porto (2000).

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