Quais são as ambições de um Director de Recursos Humanos (RH) no século XXI?
Apoiar a estratégia do negócio e acrescentar valor. A dinâmica do mercado, com a crescente globalização, concorrência, evolução tecnológica e simultaneamente, a mudança da força de trabalho, na sua preparação, aspirações e expectativas, traz novos desafios para os profissionais de RH. Temos que garantir que um colaborador Fnac em Espanha, na França, ou no Brasil, actua com o mesmo nível de desempenho que qualquer outro colaborador da empresa em Portugal. Temos que garantir que as estruturas das lojas estão adaptadas para responder às nossas campanhas de comunicação... Penso que o grande desafio é garantir a flexibilidade dos recursos humanos – adaptação a novos contextos de trabalho, negócios, funções, responsabilidades – de forma a responder rapidamente ao meio e simultaneamente garantir a identidade da empresa onde se opera, com uma estrutura de custos equilibrada.
Enquanto gestora de RH, quais são as suas principais responsabilidades?
A grande responsabilidade é efectivamente ser um parceiro empresarial, o que se desmonta em participar no processo de definição da estratégia da empresa; fazer questões que permitam converter a estratégia em acção e conceber práticas de RH que se ajustem à estratégia definida. Não gosto muito de enumerar responsabilidades, limitando-me a inventariar as grandes e tradicionais áreas de intervenção dos RH... O que temos é que reflectir primeiro nos resultados da nossa actividade e só depois nas actividades necessárias para alcançá-los. Paralelamente, e no que respeita às práticas de RH, é algo que considero não só da responsabilidade da direcção de RH, mas também dos gestores de linha. Os gestores aportam a autoridade, o poder e o patrocínio, enquanto os RH aportam perícia técnica, isenção e visão transversal. Ambas as partes trazem competências específicas para a missão comum que são os resultados empresariais, em que a combinação é maior que a soma das partes.
Em que medida considera que a gestão dos RH tem contribuído para o sucesso da Fnac em Portugal?
A empresa tem uma história de crescimento e sucesso no nosso país, contrariando as expectativas iniciais do Grupo. Para isso, tem sido fundamental garantir a quantidade e acima de tudo a qualidade das pessoas necessárias. Tudo isso passa pela forma como nos posicionamos para atrair, desenvolver e reter pessoas. O ambiente de trabalho que se vive é fantástico, com índices de “turnover” muito abaixo da média da distribuição e com índices de satisfação que marcam a diferença mesmo no panorama da Fnac internacional.
Qual o perfil de um colaborador Fnac?
Na Fnac temos obviamente perfis de competências estruturados por funções e alinhados com as respectivas responsabilidades. Na medida em que temos funções diversas, também temos perfis distintos. De qualquer modo, de uma forma mais generalista, podemos dizer que quando procuramos alguém para trabalhar na Fnac, procuramos essencialmente alguém que tenha gosto pelos produtos que vendemos... O conhecimento técnico é importante, mas na medida em que damos muita formação interna, o essencial é mesmo a emoção que cada pessoa coloca na descrição ou na venda de um livro, de um CD, ou de uma máquina fotográfica.
A Fnac, dada a sua dimensão, tem um Departamento de Recursos Humanos correspondente, enquanto que as empresas de menor dimensão apenas têm um departamento de pessoal. Em que aspectos difere a gestão de RH numa empresa multinacional?
Penso que os princípios e os objectivos da gestão de RH, ou de pessoas, são sempre os mesmos. O que variam são as estratégias e políticas adoptadas (para garantir coerência com o negócio) e consequentemente, a própria estrutura do departamento de RH. Há obviamente algumas questões que se abordam de forma diferente, entre uma empresa que factura 50K€ e uma empresa que factura 300k€, tal como há entre uma empresa multinacional e uma empresa nacional. Mas também o há entre empresas multinacionais, em que, numas o grau de “reporting” e imposição da casa mãe é muito centralizado, e noutras, em que se insere a Fnac, o grau de autonomia e adaptação ao mercado local, é bastante grande.
Considera que os órgãos de gestão de RH vêm assumindo progressivamente um papel de consultores, realizando apoio e aconselhamento técnico às áreas operacionais?
Mais do que dizer que o papel dos RH mudou de... para... (operacional para estratégico, policiamento para parceria, administrativo para consultivo...), prefiro assumir que os papéis dos RH são multiplos e não singulares. Para os profissionais de RH adicionarem valor em empresas cada vez mais complexas, precisam de desempenhar papéis cada vez mais complexos e às vezes até mesmo paradoxais. Devem desempenhar papéis operacionais e simultaneamente estratégicos; precisam ao mesmo tempo de ser controladores e parceiros; assumir responsabilidades tanto por metas qualitativas, como quantitativas... Ser um parceiro empresarial é ser simultaneamente um parceiro estratégico, um especialista administrativo, um defensor dos colaboradores e um agente da mudança. O que pode acontecer é que num determinado momento, numa determinada empresa, um dos papéis se destaque mais, para responder às necessidades actuais. É contingencial. No que respeita à relação RH e operacionais, penso que os papéis de ambos se complementam, tendo todos um objectivo comum. Apesar das possíveis diferenças de perspectiva e abordagem é vantajoso encontrar o terreno comum, onde o conflito de interesses é substituído pelo compromisso.
O “coaching” é tido, nos dias de hoje, como uma valência para muitos gestores. Pensa que se trata de uma moda ou que há uma mais-valia associada?
Há claramente uma mais-valia, em tudo o que se traduza em planos de desenvolvimento adaptados às necessidades e especificidades de cada indivíduo. Prefiro claramente planos individuais de desenvolvimento vs formação massificada para grandes grupos. Para mim o “coaching” insere-se nessa perspectiva mais individualizada e mais do que uma moda, acho que é uma resposta à mudança da força de trabalho e às necessidades das empresas e das pessoas que nelas trabalham. Na Fnac usamos para a direcção e tem funcionado muito bem. É talvez uma prática mais difícil de alargar à generalidade dos colaboradores, pela sua dimensão e dispersão.
Segundo dados publicados recentemente, “as grandes empresas não são referência a gerir pessoas”. Concorda?
Como já referido, fazer RH numa grande empresa e numa empresa de dimensão inferior, pode ser diferente, embora se mantenham os mesmos princípios e objectivos. Numa empresa com um número reduzido de colaboradores é mais fácil chegar às necessidades e expectativas de cada um, em termos de formação, comunicação, pacotes de benefícios personalizados, etc., quer porque é mais fácil conhecer as pessoas pessoalmente, quer porque é mais fácil gerir os processos internamente. Numa empresa maior há tendência para ‘massificar’ os procedimentos e políticas, o que pode gerar frustração em algumas pessoas, pois as respectivas necessidades não são tão especificamente respondidas. No entanto, empresas grandes têm outro tipo de vantagens, que no meu entender se traduzem em mais-valias para os colaboradores: o volume de negócio, que normalmente tem impacto em prémios de vencimento; a complexidade e diversidade que se reflecte na valorização das funções; o acesso a vantagens de determinados planos e benefícios, porque negociados em grande escala... Penso que no geral o que acontece é que as pessoas são cada vez mais exigentes com as empresas, o que também é bom porque força a melhoria contínua.
Biografia
Directora de Recursos Humanos da Fnac Portugal desde Junho de 2007. Exerceu as mesmas funções na Masterfoods Portugal, no Grupo Sumol, no Carrefour Portugal e na Telepizza Portugal, onde começou a carreira como técnica de RH. Desempenhou as funções de consultora e formadora na Dynergie Portugal. Foi consultora independente na área de “outplacement”. Licenciada em Psicologia, com especialização em Psicologia Social e das Organizações, pela Universidade de Lisboa, em 1995, fez uma pós-graduação em Gestão de Recursos Humanos no Instituto Superior de Gestão e uma formação avançada em Gestão para Alta Direcção no INDEG/ISCTE.
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