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#308 | JUNHO 2011
CRISTINA COSTA
Chefe de Divisão da Segurança do Doente na DGS
"Todos os profissionais ou cidadãos podem notificar no Sistema através do preenchimento de um formulário, disponibilizado por uma aplicação informática online"

A DGS pretende lançar no próximo mês de Junho um sistema piloto de notificações de erros médicos. Quais os objectivos da criação deste sistema?
Os eventos adversos devem-se à crescente complexidade na gestão dos doentes, em que interferem factores organizacionais, factores relacionados com os profissionais e factores relacionados com a doença. Os danos que estes eventos podem causar aos doentes e os custos neles implicados são de tal relevância, que as principais organizações de saúde, tais como a Organização Mundial da Saúde, a Organização Pan Americana da Saúde e o Comité de Saúde do Conselho Europeu, assim como diversas agências e organismos internacionais, desenvolveram estratégias nos últimos anos, para propor planos, acções e medidas legislativas que permitam controlar os eventos adversos evitáveis na prática clínica.
Os objectivos da implementação do SNNIEA são:

- Estabelecer um sistema para detetar ativamente os erros latentes
- Melhorar e redesenhar os processos para minimizar os erros e os eventos adversos
- Construir uma cultura de segurança

Através da análise dos incidentes e eventos adversos reportados é possível implementar medidas para a sua prevenção evitando a sua repetição no futuro. Este Sistema permite melhorar a segurança do doente através da aprendizagem.
Os Sistemas Nacionais de Notificação e Aprendizagem em Segurança do Doente são indispensáveis, para construir uma cultura de segurança nas organizações porque mobilizam os atores sobre o problema do risco e promovem a reflexão sobre a segurança. A eficácia destes sistemas depende em grande medida da existência de uma cultura de segurança, mas é também um instrumento indispensável para construir essa cultura.
A segurança do doente ser abordada de uma forma sistémica, o que pressupõe:

- Uma concepção sistemática de estruturas, procedimentos e processos seguros;
- A implementação de medidas corretoras após os incidentes;
- Aceitar que os erros são uma consequência da falibilidade normal humana e/ou deficiências do sistema e que podem ser prevenidos através da melhoria das condições de trabalho.

Uma cultura de segurança é uma cultura onde todos estão conscientes do seu papel e contribuição para a organização, e do que pode correr mal. É uma cultura justa e aberta, onde os profissionais podem aprender com os erros e corrigi-los. A segurança deve ser valorizada como uma prioridade dos serviços de saúde, mesmo que à custa da produtividade e da eficiência. A resposta a um problema não deve excluir a responsabilidade individual, mas deve centrar-se na melhoria do desempenho organizacional e não na culpabilização.
Para a concepção deste Sistema apoiámo-nos em orientações internacionais tais como:

- A Recommendation (2006)7 of the Committee of Ministers to members states on management of patient safety and prevention of adverse events in health care;
- A Council Recommendation on patient safety and prevention and control of healthcare associated infections
de Junho 2009;
- A International Classification for Patient Safety da World Alliance for Patient Safety da OMS. Esta classificação harmoniza e agrupa conceitos chave sobre segurança do doente. Permite identificar e analisar factores relevantes em segurança do doente de forma a promover a aprendizagem e a melhoria dos sistemas, representando o consenso de peritos internacionais acerca do entendimento actual sobre segurança do doente.

Por último, será ainda necessário estabelecer um marco jurídico para fomentar a mudança normativa facilitadora da comunicação de eventos adversos.

Como irá funcionar, exactamente esta nova plataforma? Quais as suas principais funcionalidades?
A segurança do doente depende de muitos factores, tais como: recursos adequados, construções adequadas, utilização de materiais, equipamentos e medicamentos de alta qualidade, estabelecimento de normas de orientação clínica, uma clara atribuição de tarefas e responsabilidades, adequados sistemas de informação, comunicação eficaz e a criação de boas condições de trabalho. Podem estar na origem de incidentes a pressão de tempo, insuficiência de pessoal, a pressão para as altas precoces. Por isso, a segurança do doente deve ser integrada em todos os processos de prestação de cuidados. Deve ser promovido o trabalho de equipa e a eficácia da comunicação, a utilização de Guidelines baseadas na evidência para o diagnóstico e tratamento, a utilização de algoritmos de segurança para áreas de risco elevado, tais como as cirurgias, as transfusões, entre outras.
Todos os profissionais ou cidadãos podem notificar no Sistema através do preenchimento de um formulário, disponibilizado por uma aplicação informática on-line. Há a possibilidade de escolher uma notificação reduzida ou uma mais completa para precaver as limitações de tempo. Em cada instituição há um profissional que vai avaliar a notificação e estudar o que foi reportado. Se for pertinente inicia um plano de melhoria de acordo com o sistema que está integrado na aplicação informática. A aplicação tem um conjunto de instrumentos básicos para a gestão dos incidentes e o desenvolvimento de planos de melhoria. Se a instituição assim o entender, pode partilhar a sua experiência e o respectivo plano de melhoria com toda a rede de instituições.
A DGS vai ter acesso a estatísticas e à informação da rede. Esta informação permite organizar melhor a atividade de desenvolvimento de normas e orientações em função do que for surgindo nas notificações mais frequentes.
A análise local das notificações permite a adoção de medidas locais de melhoria contínua. A análise global, nacional permite a partilha e disseminação de informação sobre os principais problemas de segurança do doente. O relatório anual produzido dará origem a normas e orientações nacionais visando a promoção da segurança do doente.

Quais são os planos que têm, a médio-longo prazo, para esta plataforma?
Está prevista para Junho a realização de um estudo piloto para testar a aplicabilidade do SNNIEA e corrigir eventuais disfuncionamentos.
O objectivo é disponibilizar o Sistema a todas as unidades de saúde, de todos os níveis de cuidados, sector público e privado, motivando os profissionais para a notificação. A adesão à notificação demonstra o compromisso com a segurança do doente, promovendo a criação de uma cultura de segurança nas unidades de saúde e apoiando os profissionais na prestação de cuidados mais seguros. Será garantida formação dos profissionais de saúde no âmbito da correcta utilização do Sistema.
As actividades a desenvolver a nível nacional são as seguintes:

- Identificar problemas do Serviço Nacional de Saúde em segurança do doente e gestão de riscos;
- Identificar e dar prioridade aos pontos críticos em matéria de segurança do doente;
- Identificar estratégias de intervenção valorizando a sua importância e viabilidade;
- Criar uma rede em segurança do doente a nível nacional;
- Promover a formação para ajudar a detetar, prevenir e analisar os eventos adversos e apoiar a implementação de práticas clínicas seguras;
- Definir indicadores de segurança do doente.

Os planos a médio e longo prazo são alargar a rede ao maior número de instituições possível, a integração numa rede multinacional para a notificação, partilhando as práticas e o conhecimento gerado por essa rede e criar uma cultura de segurança assente na partilha das melhores práticas internacionais.

Que lacunas ela vem preencher em relação ao sistema utilizado anteriormente?
Actualmente cada instituição faz uma gestão local da informação e trata os eventos e os incidentes de acordo com práticas locais. Não há uma visão global do que acontece em cada local e não há partilha de experiências. Cada instituição vê-se obrigada a lidar com situações que porventura outras já conseguem controlar e prevenir. No fundo corremos o risco de repetir práticas menos seguras quando já há quem as saiba identificar e prevenir dentro da rede de prestadores de cuidados de saúde.
Não existe uma cultura de segurança nas unidades de saúde. Algumas unidades de saúde têm sistemas de notificação implementados, mas esta não é uma prática ainda generalizada. O que se pretende é esbater este gap na cultura de segurança entre unidades de saúde e disponibilizar uma ferramenta uniforme que permita a aprendizagem com os erros, o desenho de sistemas mais seguros que apoiem os profissionais de saúde na prestação de cuidados seguros.

Quem poderá ter acesso e utilizar esta plataforma?
A notificação de um incidente ou um evento adverso pode ser efectuado por um profissional, um doente, um familiar de um doente ou por quem tenha conhecimento de um incidente ou evento adverso. Cabe a cada unidade de saúde designar profissionais dedicados à área da segurança do doente, garantir a sua adequada formação, promover a análise dos incidentes e eventos adversos e a implementação de medidas corretoras. As notificações são centralizadas na DGS, e objecto de análise por uma equipa especializada, que produzirá um relatório anual. Da análise das notificações decorrerão normas e orientações nacionais visando a melhoria da segurança dos cuidados.

A utilização de uma plataforma deste tipo, ou semelhante, poderia estender-se a outras áreas do sector público?
Este Sistema será disponibilizado a todas as unidades de prestação de cuidados de saúde: hospitais, centros de saúde e unidades de cuidados continuados. Também poderão aderir a este Sistema de notificação unidades de saúde privadas.

A DGS também prevê o lançamento de um observatório de segurança, que pretende ser uma ferramenta de informação sobre segurança do paciente. Quais os seu principais objectivos e para quando a sua implementação?
A criação do Observatório em Segurança do Doente vai ao encontro das recomendações internacionais que visam a partilha de informação entre profissionais de saúde e também a informação ao cidadão como forma de o envolver no processo da segurança do doente. Os doentes devem ser informados dos standards de segurança do doente, das boas práticas e medidas de segurança do doente em curso e como podem aceder a informação compreensiva sobre esta temática.
O Observatório da Segurança do Doente é uma ferramenta para difundir informação nacional e internacional sobre segurança do doente, identificando as questões relativas à segurança da prestação dos cuidados de saúde e assegurando que as medidas preventivas adequadas são disponibilizadas.
As fontes de informação do Observatório são os outputs do Sistema Nacional de Notificação de Incidentes e de Eventos Adversos e da Avaliação de Cultura de Segurança das unidades de saúde e ainda a informação de organizações de referência nesta área, como é o caso, por exemplo, da World Alliance for Patient Safety, ou de outras organizações com quem o Observatório venha a estabelecer parcerias.
O Observatório em Segurança do Doente tem como principais objectivos:

- Conhecer os problemas relativos à segurança da prestação dos cuidados de saúde aos doentes e Implementar as medidas preventivas adequadas;
- Difundir boas práticas em segurança do doente;
- Disponibilizar a informação disponível em segurança do doente aos profissionais e aos cidadãos;

Através do Observatório de Segurança do Doente será partilhada informação sobre todos projectos e actividades desenvolvidas pela DGS, no âmbito da segurança do doente, tais como as infecções associadas aos cuidados de saúde, as resistências aos antibióticos, a campanha nacional de higiene das mãos, as cirurgias seguras, a segurança do medicamento, as quedas, as feridas, entre outros.
Todos podem ter acesso a esta informação, profissionais e cidadãos. Pretende-se fomentar o debate público sobre o erro em saúde, divulgar informação e sensibilizar os cidadãos sobre riscos para a saúde e promover a participação dos doentes ou as suas associações na gestão do risco.
A implementação do Observatório de Segurança do Doente está prevista para junho próximo.

Biografia
Cristina Costa é licenciada em Medicina, especializada em Saúde Pública (Ordem dos Médicos). Tem uma pós-graduação em Saúde Internacional (especialista em Saúde Ocupacional - Ordem dos Médicos) e outra em Infecção Relacionada com os Cuidados de Saúde.
Pertence à chefia do Serviço de Saúde Pública do Centro de Saúde do Bonfim-Setúbal; é coordenadora da Comissão de Controlo de Infecção da Sub-Região de Saúde de Setúbal; coordenadora do Programa de Saúde Ocupacional da Sub-Região de Saúde de Setúbal; e Orientadora de formação do Internato Complementar de Saúde Pública.

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