Qual a missão e os valores da Bial?
A empresa tem como missão investigar, desenvolver e disponibilizar novas soluções terapêuticas na área da saúde. Temos como objectivo proporcionar mais saúde e mais qualidade de vida às pessoas.
A busca de novas soluções terapêuticas, a qualidade dos nossos produtos e satisfação das necessidades dos médicos, farmacêuticos, outros profissionais de saúde e pacientes, são as prioridades de todos os que trabalham na Bial. O nosso plano estratégico reflecte a missão e os valores que perfilhamos.
Que serviços e produtos fornece a empresa na área da saúde e terapêutica?
A Bial produz e comercializa produtos inovadores de várias áreas terapêuticas. Destacaria os fármacos da área cardiovascular, respiratória, anti-inflamatórios, ansiolíticos, antidepressivos e a nossa gama de antibióticos. Vários dos nossos produtos são líderes dos respectivos segmentos terapêuticos, como Clavamox, Reumon, Exxiv, Folicil e Folifer.
Em Espanha centralizámos a produção de vacinas antialérgicas, que comercializamos no país vizinho, Portugal e Itália.
Estamos também muito perto de colocar no mercado mundial o primeiro fármaco, fruto do nosso trabalho de I&D, em colaboração com diversas instituições internacionais, que é um novo antiepiléptico, de nome Zebinix, e que será lançado a nível mundial no último trimestre deste ano.
A nossa investigação está orientada para o sistema nervoso central e área cardiovascular, onde sentimos que podem haver avanços terapêuticos importantes que contribuam para a saúde e bem-estar das pessoas.
A Bial distribui os seus produtos para mais de 30 países, entre a Europa, América, África e Ásia. Como surgiu essa oportunidade de expansão? Foi uma aposta calculada (por força do interesse estrangeiro nos vossos produtos) ou antes uma aposta de risco, sem garantias de sucesso?
Há cerca de duas décadas assumimos a investigação e desenvolvimento de novos fármacos como área estratégica para o futuro da companhia, conscientes que seria um percurso difícil, moroso, arriscado e extremamente dispendioso. Não teria cabimento encetar um projecto de I&D na indústria farmacêutica tendo como objectivo um mercado de 10 milhões de habitantes. Sentimos por isso necessidade de ganhar escala, crescer para os mercados internacionais, para que pudéssemos viabilizar os projectos de I&D e rentabilizar esses mesmos projectos.
Quando encetámos a nossa estratégia de internacionalização escolhemos como primeiro alvo países mais pequenos, nomeadamente em África e América Latina. Em 1998 demos o primeiro passo na Europa, com a aquisição de uma empresa espanhola que operava no mercado dos produtos de imunoterapia e tinha investigação nessa mesma área. Actualmente, distribuímos os nossos produtos na Europa, América, África e Ásia. Temos filiais em Espanha, Angola, Moçambique, Panamá e Costa do Marfim. Destacaria a nossa presença em Espanha (que é o sétimo mercado farmacêutico mundial), com uma equipa de 180 colaboradores, e onde concentramos a produção de vacinas e a pesquisa em alergologia. Estamos também a comercializar uma gama de especialidades éticas, com destaque para as áreas respiratória e cardiovascular.
Acho que a aposta na internacionalização foi calculada e, obviamente, teve inerente o factor risco, como, aliás, é comum a todos estes projectos. Com a entrada do Zebinix no mercado internacional, penso que estaremos em condições de assumir uma dimensão diferente no contexto internacional. Directa ou indirectamente, através dos nossos licenciados, a Bial estará presente até final de 2010 em mais de 60 países, com particular destaque para a Europa.
Qual a estratégia que a empresa desenvolveu para atingir o actual reconhecimento nacional e internacional? E para o futuro, como enfrentar a crescente competitividade do mercado?
Optámos pela diferenciação, ou seja, por oferecer ao mercado produtos inovadores e distintivos face a outros medicamentos existentes. Daí a aposta na investigação própria realizada há duas décadas.
Temos um centro de I&D, reunimos uma equipa que actualmente é composta por 100 pessoas de sete nacionalidades diferentes (entre as quais 23 doutoradas) e estabelecemos parcerias com instituições internacionais. Ao longo dos anos fomos canalizando fortes investimentos para esta área. Investimos mais de 20% da nossa facturação, o que em 2008 representou mais de 30 milhões de euros, em I&D. Como resultado desta estratégia, vamos no final deste ano lançar no mercado o Zebinix, o primeiro medicamento de patente portuguesa.
Encontrámos parceiros para nos ajudarem a comercializar o fármaco à escala mundial. No final de 2007 estabelecemos um acordo de licenciamento com uma empresa norte americana, Sepracor, para a sua comercialização nos Estados Unidos e Canadá. Na Europa temos como parceiro a Eisai. Ambas as empresas são especializadas no sistema nervoso central.
O trabalho dos nossos técnicos continua, os investimentos também e contamos poder lançar no mercado mundial, até 2020, cinco novos fármacos, essencialmente na área do sistema nervoso central e cardiovascular.
Acreditamos que a aposta na I&D, concertada com a estratégia sustentada de internacionalização do grupo, são instrumentos diferenciadores que nos ajudarão a enfrentar a competitividade do mercado farmacêutico.
Não nos restringindo apenas ao vosso core business, mas alargando à generalidade do sector empresarial português, como poderá o nosso país aumentar o seu potencial competitivo? É tudo uma questão de marketing, ou Portugal tem que apostar seriamente na qualidade?
As nossas empresas, industriais ou de serviços, têm de ter como pilares a qualidade e a diferenciação. Portugal não consegue ser aliciante, nem competitivo, tendo como base o custo da mão-de-obra ou a escala do mercado. As empresas, para terem potencial competitivo, têm de encontrar eixos distintivos, que acredito poderem passar pela qualidade e diferenciação dos produtos e serviços que oferecem.
Todos sabemos que o mercado nacional é minúsculo, exigindo, por parte das empresas portuguesas, audácia para conseguirem sobreviver. Que receita dá aos empresários portugueses, caso assumam uma aposta no estrangeiro?
Não podemos dar receitas mas podemos partilhar uma experiência. Uma estratégia de internacionalização tem de ser bem pensada e estruturada, englobando as oportunidades e os riscos de determinado mercado e, consequentemente, a adaptação às suas características. Considero que avançar com uma aposta no estrangeiro implica ter uma base sólida no país de origem que possa servir de retaguarda e apoiar o arranque e consolidação desse projecto. Ter um plano de contingência, estar preparado para o insucesso, ser persistente nos seus objectivos, será fundamental para ter sucesso.
A inovação é uma imagem de marca da Bial. Sente que existem outros exemplos no país, ou ainda sofremos de um excesso de conservadorismo e medo face ao desconhecido?
Felizmente, cada vez mais vão existindo outros exemplos no país que são indicadores positivos de mudança ao nível de mentalidades, nomeadamente na capacidade de arriscar, de estabelecer pontes entre pares e no estabelecimento de redes de cooperação. Na área da saúde, por exemplo, temos um conjunto de empresas na área da biotecnologia, dos dispositivos médicos e diagnóstico, a começarem a comercializar novos produtos e novos serviços competitivos à escala global.
O capital humano é fulcral para qualquer empresa. Infelizmente, muito dos nossos "cérebros" têm que sair das nossas fronteiras para verem reconhecidas as suas faculdades. Portugal está condenado a perder o que tem de melhor entre os seus recursos? O que poderá ser feito para inverter essa tendência?
Há condições para a mudança e hoje será porventura mais fácil do que na década de oitenta ou noventa. Quando foi criado o nosso departamento de I&D não existiam em Portugal técnicos com formação e experiência em algumas vertentes associadas à investigação de um novo fármaco. Foi possível atrair alguns técnicos estrangeiros na área da I&D para trabalharem na Bial, bem como formar técnicos portugueses, com formação académica em Portugal ou no estrangeiro. Hoje, não é difícil encontrar jovens portugueses com um curriculum científico interessante e competitivo a nível internacional interessados em viver em Portugal. Porventura, a maior dificuldade estará na dificuldade em proporcionar desafios profissionais atractivos para essas pessoas, por parte do meio empresarial.
Há um crescente número de portugueses com experiência internacional, muitos deles com disponibilidade e gosto em regressar ao nosso país. Temos tido uma experiência positiva nesse campo. Hoje contamos com diversos colaboradores a trabalhar connosco e que estavam a trabalhar na Europa em empresas internacionais, não só nas áreas científicas. No sector do desenvolvimento de negócio, financeiro e marketing, temos colegas cujo anterior local de trabalho não era em Portugal.
Penso que o país tem condições para ser atractivo a nível mundial, em termos de recursos humanos. Localização geográfica, clima, estabilidade social, nível de desenvolvimento sócio-económico, cultura – nomeadamente a aceitação de pessoas estrangeiras e conhecimento de idiomas –, são factores que potenciam a possibilidade de atrair e reter profissionais de alto nível.
E que medidas devem ser tomadas no sentido de aumentar as qualificações profissionais dos recursos humanos?
A aposta na formação é crucial. Da formação de base, que tem início nas escolas primárias até à universidade. A par da preocupação em ganhar massa crítica ao nível do número de pessoas com formação, será igualmente fundamental uma cultura de rigor e exigência no nosso sistema de ensino. Quanto à formação profissional continuada, será importante incentivar e sensibilizar as empresas, em particular as PME, para o valor acrescentado que poderão ter se os seus colaboradores melhorarem o desempenho através da obtenção de maiores competências.
Por fim, exige-se uma estratégia comum para Portugal, que permita evoluir e crescer social e economicamente. Fazendo uma análise interna e externa, quais as nossas forças e fraquezas, bem como as oportunidades e ameaças que se colocam ao país?
Numa análise algo simples diria:
Forças: a estabilidade social, a abertura mental ao exterior, a capacidade de fazer face a situações imprevistas e a vontade de mudança.
Fraquezas: a falta de uma cultura de planeamento e rigor, o individualismo e a falta de auto-estima, o sistema de justiça, a falta de cooperação e de transferência de conhecimento entre universidades, instituições de investigação e empresas.
Oportunidades: o período de transformação que as empresas estão a viver com a incorporação de mais tecnologia, maior especialização e com uma maior aposta na inovação. Numa época de profundas mudanças, quem tem vontade de mudança pode ter uma vantagem competitiva.
Ameaças: o podermos não vir a ter a capacidade de mudança que o mundo nos exige, particularmente ao nível dos sectores considerados tradicionais, uma situação financeira grave a nível nacional, tanto nas contas públicas, como no endividamento externo, que pode criar fortes entraves ao financiamento dos agentes económicos, não concretizarmos as reformas estruturais que necessitamos de fazer (administração pública, ensino, justiça, etc).